Sobre os Desafios para a Aprovação de um Fundo de Índice à Vista de Ether

Sobre os Desafios para a Aprovação de um Fundo de Índice à Vista de Ether

1.0 Os Fundos de Índice à Vista de Bitcoin

A despeito das altas taxas de juros ao redor do mundo, o bitcoin e outros criptoativos chamaram a atenção do público investidor ao apresentarem retornos extraordinários ao longo do ano de 2023 e no primeiro semestre de 2024 (de janeiro de 2023 para cá, a alta acumulada é de mais de 300%[1]). Um dos principais catalisadores desta alta foi a aprovação e negociação de uma série de fundos de índice (Exchange Traded Funds ou ETFs) à vista de bitcoin, no dia 10 de janeiro de 2024, pela Securities and Exchange Comission – SEC, órgão regulador do mercado de capitais norte-americano.

As aprovações foram o corolário de anos de demanda pelo público investidor por veículos de investimento que garantissem a devida exposição aos criptoativos, em especial o bitcoin. Gestoras de recursos ao redor do mundo, inclusive no Brasil, atentas à demanda reprimida, estruturaram os produtos financeiros aplicáveis, conforme o caso, e aguardaram pacientemente o aval dos seus respectivos reguladores.

Por conseguinte, esperando observar oscilações de preço semelhantes, investidores e entusiastas dos criptoativos alimentaram ao longo de meses as expectativas pela aprovação de fundos de índice à vista de Ether[2], token nativo da Ethereum Mainnet[3], principal blockchain descentralizada de contratos inteligentes e o segundo maior criptoativo em valor de mercado hoje[4]. Com efeito, ganharam atenção as aplicações feitas junto à SEC com pedidos de registro de fundos de índice à vista de Ether, incluindo grandes gestoras internacionais, como a Grayscale, Fidelity Investments e Bitwise.

A demora por parte do regulador – cujas decisões eram previstas para meados de maio – ligou o sinal de alerta nos investidores quanto à possibilidade da aprovação e eventuais desafios a serem enfrentados pelas gestoras, mas que foi logo resolvido numa incrível reviravolta. Após diversas especulações e quebras de expectativa, em 23 de maio de 2024, foram aprovados pela SEC os Forms 19b-4 protocolados por algumas gestoras: uma exigência regulatória fundamental para a aprovação dos seus respectivos fundos de índice à vista de Ether. Todavia, seguem pendentes os Forms S-1, exigência regulatória igualmente necessária para permitir a efetiva negociação dos fundos – embora a tendência do regulador já tenha sido estabelecida e a aprovação seja considerada iminente.

Sendo assim, neste breve artigo, buscamos – sem qualquer pretensão de esgotar o tema – explorar alguns dos desafios regulatórios enfrentados para a aprovação dos fundos de índice à vista de Ether pela SEC, tendo em vista a sua iminente aprovação.

2.0 Fundos de Índice

Um fundo de índice à vista ou ETF (Exchange Traded Fund) é um fundo de investimento que busca replicar a rentabilidade de determinado índice, composto por uma cesta de ativos com diferentes pesos. Assim, ao obter cotas de um fundo de índice, o investidor passa a estar exposto à tese de investimento dos ativos que compõem aquela carteira, sem que seja necessária a aquisição direta destes.

Os pesos são determinados pelo próprio gestor, podendo ser ajustados de acordo com a sua preferência e/ou estratégia de gestão. No caso dos fundos de índice à vista de bitcoin, por se tratar de um fundo mono-ativo, o seu objetivo é replicar a rentabilidade de um índice composto inteiramente por bitcoin, ou algo muito próximo disso. Logo, o fundo buscará seguir estritamente as variações de preço do bitcoin.

Ao lançar um fundo de índice à vista o gestor se obriga a direcionar o fluxo de capitais recebido na venda à mercado das cotas à aquisição, custódia e manutenção da propriedade de bitcoins – algo que não acontecia anteriormente com os fundos de índice de futuros[5]. Dessa forma, os fundos de índice à vista proporcionaram um veículo simples e eficiente para se investir em bitcoin, o que ampliou a possibilidade de exposição para uma nova gama de investidores, além de eliminar o risco e as dificuldades de se realizar a auto-custódia.

Como resultado, abriram-se as portas para o enorme fluxo de capitais vindo de investidores institucionais como grandes bancos de investimento, gestoras de recursos, fundos de pensão e Family Offices. Naturalmente, a entrada dos investidores institucionais teve grande impacto na valorização do bitcoin, demonstrando a força e importância dessa aprovação.

De toda sorte, a aprovação pelo regulador não isentou o bitcoin das duras críticas feitas pelo Presidente da SEC, Gary Gensler, que, na declaração em que aprovou a negociação dos fundos, destacou:“Though we’re merit neutral, I’d note that the underlying assets in the metals ETPs have consumer and industrial uses, while in contrast bitcoin is primarily a speculative, volatile asset that’s also used for illicit activity including ransomware, money laundering, sanction evasion, and terrorist financing.” (grifos nossos)

A aprovação, portanto, parece ter sido a contragosto, além de somente ter sido viável em função da não configuração do bitcoin como security (valor mobiliário), para fins da regulação da SEC. No decorrer da declaração, o ativo foi classificado como uma “non-security commodity”[6], o que justifica o enquadramento regulatório e a aprovação da listagem e negociação dos fundos de índice à vista em bolsa. Tal configuração encontra respaldo em características intrínsecas da rede Bitcoin, as quais não estão presentes na Ethereum Mainnet, ao menos não em mesma intensidade.

3.0 Mercado de Capitais e Tokens 

A aquisição de ações de emissão de uma companhia nada mais é que uma forma de se associar a um determinado empreendimento, apostando naquela atividade empresária a fim de, futuramente, colher os frutos correspondentes na forma de proventos distribuídos como resultado do exercício social. A escolha de uma companhia em detrimento da outra pode passar por diversas abordagens e metodologias de análise – as quais deveriam ficar somente à cargo do investidor.[7]

Isso vale para o investidor prudente, afinal, nada impede a tomada de uma decisão de investimento sem qualquer embasamento técnico ou teórico. Vale lembrar que comprar ações apenas por recomendação do seu influenciador digital preferido, por exemplo, não é errado, mas também não é nada diligente.

Uma das mais renomadas e assertivas escolas de investimento em ações, à qual se filiam nomes como Joel Greenblatt, Warren Buffet, Charlie Munger e Benjamin Graham, aposta alto nos fundamentos financeiros das suas companhias emissoras: o value investing[8]. Busca-se companhias perenes, com bons resultados operacionais, relevante histórico de rentabilidade e negociadas em mercado a valores “satisfatórios”, tendo em vista a sua capacidade de geração de caixa ao longo do tempo. Outros fatores mais subjetivos, como a relevância da marca, experiência dos membros da administração da companhia e a existência (ou não) de uma vantagem competitiva, também podem ser levados em consideração.

Isto é, apostando no sucesso empresarial de determinada companhia, o investidor a escolhe (seja lá por quais forem os seus motivos) e decide aportar parte do seu capital nela, transferindo os seus recursos, na condição de agente superavitário, para o patrimônio da sociedade, enquanto agente deficitário. O instrumento utilizado para garantir esta transferência de recursos é, em primeira análise, toda a robusta estrutura formada pelo mercado de capitais, amparado por um complexo aparato regulatório promovido pelo Estado, sobretudo por meio da Comissão de Valores Mobiliários (CVM), e por alguns agentes privados, como a B3 S.A. – Brasil, Bolsa, Balcão, a ANBIMA (Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais) e outras entidades de autorregulação voluntárias ou não[9]. Em última análise, contudo, é a livre negociação com as ações de emissão da companhia, enquanto títulos representativos de frações do seu capital social, que permite a associação entre o investidor e a sociedade empresária[10].

Paralelamente, diversos tokens emitidos e livremente negociados nos mais variados mercados de ativos digitais, centralizados e descentralizados, assemelham-se muito, em determinados aspectos, às ações de emissão de companhias abertas. A aquisição destes tokens passa a servir não somente como veículo de investimento, mas também de participação indireta em projetos estruturados no ambiente cripto e a interação com seus ecossistemas independentes.

A título de exemplo, determinados tokens considerados utility tokens, bem como alguns tokens de governança, permitem a votação, pelos seus detentores, em eventuais alterações a serem promovidas nos protocolos dos seus respectivos ativos digitais, enquanto o direito de voto é usualmente proporcional à participação daquele investidor no respectivo protocolo. Adicionalmente, redes blockchain baseadas em protocolos

Proof-of-Stake ou “prova de participação” (em tradução literal), emitem novos tokens através de um processo chamado staking, por meio do qual remunera-se os participantes envolvidos na criação de novos blocos, incluindo, mas não se limitando, aos validadores destes.[11]

A Ethereum Mainnet, ainda no final de 2022, logrou a transição para o modelo Proof-of-Stake, deixando para trás o tradicional Proof-of-Work[12] empregado pela rede Bitcoin desde o seu surgimento[13]. As principais razões apontadas para a mudança foram:

(i) facilitação da operacionalização dos nós (aqueles que executam o software da rede); (ii) promoção de uma política monetária deflacionária; e (iii) considerações de ordem ambiental, tendo em vista o alto custo, em consumo de energia elétrica, gerado pela manutenção de um sistema baseado no modelo Proof-of-Work[14]. Consequentemente, a emissão de novos Ethers, o token nativo da rede, ocorre por meio da execução de nós instalados em computadores, celulares ou notebooks convencionais, com remunerações proporcionais ao investimento colocado à disposição da rede por meio do referido processo de staking – no caso da remuneração paga pela validação de blocos.

A narrativa principal ou o objeto da Ethereum Mainnet também está sempre a mudar, assim como as suas regras de consenso e sua política de emissão monetária, ora ilimitada. Hoje ela serve, sobretudo, como uma enorme plataforma para desenvolvimento e uso de aplicações tokenizadas, baseada numa rede Blockchain, peer-to-peer (ponto a ponto), que valida seus blocos e remunera parte dos usuários por meio dos referidos mecanismos de prova de participação e staking. Além disso, a Ethereum Mainnet, diferentemente do Bitcoin[15], conta com uma equipe especializada e focada em solucionar os gargalos enfrentados no seu uso diário, corrigindo eventuais bugs e implementando mudanças estruturais capazes de melhorar a rede – como na atualização supracitada, intitulada “Ethereum 2.0”.

Trata-se aqui da Ethereum Foundation, uma organização sem fins lucrativos, sediada na Suíça, e que conta com o seu próprio site oficial[16], onde explica no que consiste a rede, seus objetivos e a história por trás do projeto. Logo, por mais que a Fundação se coloque em seu site como uma “organização estritamente sem fins lucrativos”[17], a discussão regulatória poderia tomar outro rumo.

Ficam claras, assim, algumas diferenças significativas entre os dois protocolos, as quais poderiam servir como base para impedir as aprovações dos fundos de índice à vista de Ether pela SEC. Isto é, determinados elementos próprios da Ethereum Mainnet, diferentemente da rede Bitcoin, têm maior grau de semelhança com os requisitos estabelecidos pela jurisprudência norte-americana para a configuração dos conceitos de contrato de investimento coletivo e security, o que poderia impedir a aprovação pelo regulador por representar uma oferta pública irregular de valores mobiliários.

Explicaremos a seguir.

4.0 O Teste de Howey

O conceito de valor mobiliário empregado pela Lei n.º 6.385, de 7 de dezembro de 1976, após a sua reforma, passou a corresponder à importação do termo security advindo do direito norte-americano, sobretudo ao introduzir a noção de contratos de investimento coletivo[18]. A definição legal deste conceito foi estabelecida na jurisprudência norte-americana após o julgamento do caso Sec v. W. J. Howey Co.[19], em 1946, pela Suprema Corte dos Estados Unidos, com base no qual desenvolveu-se o chamado “Teste de Howey”.

O julgamento cingia sobre a configuração dos contratos de serviços associados à aquisição de propriedades agrícolas pela Howey Co., uma sociedade empresária, como contratos de investimento coletivo, o que atrairia a competência da SEC para impor sobre ela a sua regulação e, consequentemente, obrigações legais como: necessidade de registro prévio perante o regulador, observância do princípio de full and fair disclosure, sujeição ao seu poder de polícia e regime sancionatório, dentre outros. A Suprema Corte acabou por decidir a favor da SEC, concluindo que os contratos da Howey Co. eram de fato contratos de investimento coletivo e, portanto, valores mobiliários.

A decisão foi embasada pelo “Teste de Howey”, desenvolvido pela própria corte, e que estabelece quatro critérios principais para determinar se uma transação, esquema ou acordo deverá ser considerada um contrato de investimento coletivo: (i) haver investimento em dinheiro por parte dos investidores; (ii) ser um empreendimento em comum, compartilhado pelos seus investidores (para bem ou para mal); (iii) haver expectativa de ganho pecuniário, pelos investidores, com o investimento; e (iv) o sucesso do empreendimento estar atrelado aos esforços de um terceiro e/ou promotor.[20]

O referido teste restou consagrado pela jurisprudência norte-americana, tendo sido empregado desde então para enquadrar ativos como securities, bem como a competência da SEC para regulá-los, caso assim fossem entendidos. Vale ressaltar que, no Brasil, a discussão foi travada com maior profundidade depois da reforma da Lei n.º 6.385, de 7 de dezembro de 1976, implementada por força da Lei n.º 10.303, de 31 de outubro de 2001. Em clara referência ao teste de Howey, o inciso IX do Art. 2º, incluído pela reforma, estabelece que serão considerados valores mobiliários, “quando ofertados publicamente, quaisquer outros títulos ou contratos de investimento coletivo, que gerem direito de participação, de parceria ou de remuneração, inclusive resultante de prestação de serviços, cujos rendimentos advêm do esforço do empreendedor ou de terceiros”.

5.0 Conclusão

Em que pese ter sido desenvolvido em meados do século passado, o teste de Howey segue sendo empregado para definir o enquadramento ou não de determinado ativo como valor mobiliário, tanto nos Estados Unidos, quanto no Brasil – conforme apontou a CVM no Parecer de Orientação n.º 40, de 11 de outubro de 202221.

Desse modo, e à vista dos requisitos arrolados pelo teste, parece-nos complexo conceber o não enquadramento do token Ether como um exemplo de security, sobretudo considerando o flagrante embate promovido pela SEC contra os criptoativos e a sua declarada antipatia quanto a estes. A dependência de esforços de terceiros – questionável na rede Bitcoin em função da sua descentralização natural – não subsiste na Ethereum Mainnet, onde, conforme já ressaltado, há uma fundação trabalhando para melhorá-la e, portanto, certo poder de ingerência.

Além disso, a narrativa dos seus desenvolvedores se altera a todo momento, fazendo com que a sua tecnologia subjacente, mais versátil e expressiva, exija refinamentos e atualizações constantes. Aliás, a conhecida existência de um criador do projeto, o programador russo, Vitalik Buterin, é controversa por si só.

Nesse sentido, segundo Saifedean Ammous, economista libanês e autor do livro “The Bitcoin Standard”, virtualmente, nenhuma altcoin[21] dispõe da credibilidade de estar fora do controle de alguém, uma vez que dependem de um time de desenvolvedores ativo para crescer e atrair investidores e novos adeptos[22]. Além disso, Michael Saylor, acionista controlador e ex-diretor-presidente da MicroStrategy, companhia aberta com a maior posição investida em bitcoin no mundo hoje, entende que o Ether deve ser considerado security e acredita (ou acreditava) que os pedidos de registro de fundos de índice à vista de Ether seriam eventualmente rejeitados pela SEC[23].

Ou seja, se o interesse da SEC fosse, de fato, a reprovação dos pedidos de registro dos fundos de índice à vista de Ether, pode-se dizer que haveria motivos suficientes para tanto. Em adição à declarada antipatia do regulador para com esta classe de ativos, começando pelo bitcoin, fica difícil entender as razões pelas quais a SEC, presidida por Gary Gensler, teria dado o aval necessário para os criptoativos ingressarem no mercado financeiro tradicional.

Alguns especulam que a iminente aprovação e repentina mudança de postura da SEC decorram da pressão política que se avizinha em razão da corrida eleitoral[24]. Os votos dos investidores e entusiastas dos criptoativos podem pesar na eleição presidencial que será realizada em novembro, fazendo com que a pauta ganhe maior relevo e extrapole a discussão meramente regulatória. Seja como for, a efetiva aprovação e negociação dos fundos em bolsa ainda é cena dos próximos capítulos, enquanto as motivações só podem ser alvo de especulação.

Por: Theo Mothe e Lucca Mothe

 Theo Mothe é graduando em Direito pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro, coordenador do Núcleo Acadêmico de Direito Societário e Mercado de Capitais da PUC-Rio e estagiário da equipe de Infraestrutura e Financiamento de Projetos do Stocche Forbes Advogados. LinkedIn: Theo Mothe.

Lucca Mothe é graduando em Ciências Econômicas pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro, trainee da Liga de Mercado Financeiro da PUC-Rio e membro do Núcleo de Ciência de Dados da PUC-Rio. LinkedIn: Lucca Mothe.

 


 

[1] Dados  retirados  do  site  da  corretora,  Bitstamp:  Bitstamp,  BTC/USD.  Disponível  em: <https://www.bitstamp.net/markets/btc/usd/>. Acesso em: 2 de junho de 2024.

[2] É importante ressaltar que o fundo de índice efetivamente investirá em Ether, que é o token nativo da Ethereum Mainnet e, portanto, a terminologia correta seria “fundo de índice à vista de Ether”.

[3] Primeira camada da rede Ethereum.

[4] Capitalização de mercado equivalente a R$2.372.572.133,772 (dois trilhões, 372 milhões, 572 mil, 133 e 772 centavos de reais), na data-base abaixo, conforme os dados do site Coin market Cap: Coin Market Cap, Ethereum. Disponível em: <https://coinmarketcap.com/pt-br/currencies/ethereum/>. Acesso em: 2 de junho de 2024.

[5] Nos Estados Unidos já negociavam fundos de índice de contratos futuros de bitcoin, devidamente aprovados pelo regulador ainda em outubro de 2021. Nesse caso, a discussão regulatória é simplificada, uma vez que os contratos derivativos são unanimemente entendidos como valores mobiliários. Contudo, com a negociação de fundos de índice de contratos futuros não há grande impacto no mercado, dado que a aquisição de contratos futuros (instrumentos derivativos) não implica em variações diretas na demanda por bitcoins, não afetando, portanto, o seu preço.

[6] Non-security Commodity é uma commodity que não pode ser considerada um valor mobiliário, como, por exemplo: ouro, prata, cobre, milho, cobalto, gás natural e café.

[7] As decisões de investimento devem ficar a cargo do investidor e demais agentes econômicos que participam do mercado de capitais, não cabendo à CVM entrar neste mérito quando da aplicação das suas normas, conforme aponta o voto da Diretora-Relatora, Maria Helena Santana: “Mas acho necessário acrescentar que não me parece ser competência da área técnica, na acusação, fazer considerações a respeito do mérito das decisões de investimento – nível de risco do fundo (que seria “desnecessário”) ou sobre a qualidade da estratégia adotada pelo administrador – quando o administrador age amparado no regulamento do fundo ou quando não se configura falta de lealdade de sua parte. Digo isso mesmo se o resultado dessas decisões de investimento gerar perdas vultosas para o fundo. Decidir onde e quando investir é decisão do administrador, que está sujeito apenas às regras contratadas com os investidores e à obrigação de agir com zelo e visando ao interesse dos investidores (além de obedecer às regras prudenciais e a outras específicas, sobre os investimentos, que estejam vigentes). Avaliações de mérito sobre decisões de negócios estão, a meu ver, fora do âmbito de atuação da CVM. O regulador deve, ao contrário, evitar que sua eventual avaliação sobre a qualidade da decisão de investimento seja fator que influencie a análise sobre a legalidade da atuação dos administrados, pois pode observar as decisões tomadas por eles em condições de certa forma mais favoráveis, e partir de um conjunto de informações não disponíveis na época da tomada de decisão e, além do mais, sem a pressão do tempo.” Processo Administrativo Sancionador CVM n.º RJ2005/8510, julgado em 04 de abril de 2007. Disponível em: https://www.cvm.gov.br. Acesso em: 07 de junho de 2024.

[8]Pouco depois da morte de Graham, em 1976, Buffett se tornou o defensor da abordagem de investimento de Graham, priorizando tanto o valor a ponto de o nome de Buffett se tornar sinônimo de investidor em valor (value investing) fácil entender por quê. Ele era o mais famoso dos dedicados alunos de Graham, e o próprio Buffett nunca perde uma oportunidade de reconhecer seu débito intelectual para com Graham.” HAGSTROM, Robert G. O Jeito Warren Buffett de Investir: A Estratégia de Valor do Maior Investidor do Mundo. 2. ed. São Paulo: HarperCollins Brasil, 2019. P. 75.

[9]Tanto a proteção dos agentes não financeiros individuais, geralmente hipossuficientes perante as instituições que lhes prestam serviços, quanto a tutela do sistema financeiro fogem à mera negociabilidade ou a soluções organizativas ‘privadas’ – a natureza daqueles riscos dificulta a criação de mercados para a sua negociação ou a sua mera internalização. Impõe-se assim, para a proteção dos clientes e do sistema financeiro (do conjunto de relações e de instituições interligadas) a regulação externa, usualmente estatal, das atividades financeiras.” YAZBEK, Otavio. Regulação do mercado financeiro e de capitais – 2. Ed. – Rio de Janeiro: Elsevier, 2009. Pgs. 175-176.

[10]Juntamente com a limitação de responsabilidade, outra característica revolucionária das sociedades por ações, que concorreu de forma substancial para a força expansiva de que é dotada, foi a divisão do capital social em alíquotas, incorporadas em títulos negociáveis que dão o nome à sociedade: isto é, as ações. A incorporação do ‘status’ de sócio num título ou valor mobiliário, negociável, e capaz de “circular como mercadoria” (como rezava o art. 36 do estatuto do famoso ‘Banco de Law’, cuja falência marcou um período da história econômica da França), completa a singularidade de que, no mundo jurídico e econômico, é dotada a S.A.. Mais ainda – e a observação é de ASCARELLI – o fato de os sócios poderem ser substituídos sem anuência dos demais – mediante a simples transferência dos títulos – constitui uma inovação tão revolucionária como a da limitação da responsabilidade.” LAMY FILHO, Alfredo; BULHÕES PEDREIRA, José Luiz. Direito das Companhias. Volume I. 1ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2009. P. 5.

[11] É importante destacar que as inúmeras aplicações construídas sobre estas redes blockchain também podem permitir o processo de staking de seus respectivos tokens nativos, utilizando seus próprios sistemas de contratos inteligentes para engajar e remunerar os seus investidores.

[12] Redes de blockchain consideradas Proof-of-Work emitem novos tokens de acordo com a quantidade de força computacional investida nela, traduzida em custos pecuniários despendidos com o alto consumo de energia elétrica pelo minerador. Dessa forma, o minerador que depositar a maior quantidade de força computacional na rede, a fim de processar dados e validar as transações contidas em um dos seus blocos para, assim, minerá-lo, será remunerado com a emissão de novos tokens. É o caso da rede Bitcoin, por exemplo.

[13]Mas o que significa dizermos que ‘a rede’ verifica as transações e as reconcilia com o registro público? E como exatamente são criados e introduzidos novos bitcoins na oferta monetária? Como vimos, porque o Bitcoin é uma rede peer-to-peer, não há uma autoridade central encarregada nem de criar unidades monetárias nem de verificar as transações. Essa rede depende dos usuários que proveem a força computacional para realizar os registros e as reconciliações das transações. Esses usuários são chamados de “mineradores”, porque são recompensados pelo seu trabalho com bitcoins recém-criados. Bitcoins são criados, ou “minerados”, à medida que milhares de computadores dispersos resolvem problemas matemáticos complexos que verificam as transações no blockchain.” ULRICH, Fernando. Bitcoin: A Moeda na Era Digital. Porto Alegre: LVM Editora, 2014. P. 19.

[14] “A rede passará de um modelo de prova de trabalho (Proof-of-Work, ou PoW) similar ao do Bitcoin, para um de prova de participação (Proof-of-Stake, ou PoS), considerado mais ecológico por utilizar 99,9% menos energia. Essa mudança era esperada há pelo menos cinco anos.” EQUIPE INFOMONEY. Ethereum 2.0: o que realmente muda na próxima grande atualização da rede?. InfoMoney, 13 abr. 2022. Disponível em: < https://www.infomoney.com.br/mercados/ethereum20-o-querealmentemudanaproximagrande atualizacaodarede/ >. Acesso em: 4 de junho de 2024.

[15] O Bitcoin é uma rede peer-to-peer e, portanto, descentralizada, tendo em vista a inexistência de intermediários. Seu protocolo é aberto a todos os seus usuários, mineradores e operadores de nós, os quais podem contribuir, sugerindo livremente mudanças, melhorias e atualizações periódicas denominadas BIP – Bitcoin Improvement Proposal. Eventuais sugestões devem ser levadas à debate e acatadas pela maioria dos operadores de nós e mineradores (validadores das transações) para serem implementadas, o que faz com que estes passem a utilizar a versão atualizada do protocolo em detrimento da anterior. A este processo foi dado o nome de “mecanismo de consenso”. Isto é, sem o consenso da maioria, não podem ser implementadas atualizações. Por conseguinte, ninguém, isoladamente, detém qualquer forma de poder de controle sobre a rede ou pode promover mudanças nela com base no seu próprio juízo de valor.

[16] ETHEREUM FOUNDATION. Ethereum Foundation, Disponível em: https://ethereum.org/pt br/foundation/. Acesso em: 4 de junho de 2024.

[17]A EF não é uma empresa, nem mesmo uma organização tradicional sem fins lucrativos. Seu papel não é controlar ou gerenciar o Ethereum, nem eles são a única organização que financia o desenvolvimento constante das tecnologias relacionadas ao Ethereum. A EF faz parte de um ecossistema muito maior.” ETHEREUM FOUNDATION. Ethereum Foundation, Disponível em: https://ethereum.org/pt br/foundation/. Acesso em: 4 de junho de 2024.

[18]Notavelmente, ao inserir os contratos de investimento coletivo no rol do art. 2º, a lei brasileira migrou da acepção mais restrita de valores mobiliários para uma mais abrangente, aproximando-se do conceito de securities do Direito norte-americano, que inspirou o disposto no inciso IX. Assim, com a redação atual do art. 2º da Lei n.º 6.385/76, serão valores mobiliários, além dos títulos expressamente previstos em seus incisos I a VIII, quaisquer outros títulos, desde que haja esforço de captação da poupança popular, com o objetivo de investimento por parte dos doadores de recursos, mas com rendimentos advindos do esforço do empreendedor ou de terceiros. Permanece, contudo, a ausência de um conceito legal de valor mobiliário, apesar de ser possível destacar algumas características que, em princípio, são comuns a grande parte dos títulos, tais como a captação da poupança popular, a padronização dos direitos inerentes e a qualificação de títulos em massa.” CORDONIZ, Gabriela; PATELLA, Laura; e COPOLA, Marina. Art. 2º. In. CORDONIZ, Gabriela; PATELLA, Laura (coord.). Op. Cit. p. 52.

[19] SEC v. W.J. Howey Co., 328 U.S. 293 (1946).

[20] “O conceito de contrato de investimento coletivo pode abarcar negócios com diversos formatos nos mais variados setores. Com efeito, a diversidade de ativos e projetos nos quais os recursos captados mediante ofertas de contratos de investimento coletivo foram investidos no passado é prova eloquente de que a destinação dos recursos, isoladamente considerada, é fator de pouca ou nenhuma relevância para a análise acerca da existência de um CIC. Laranjas certamente não são valores mobiliários, assim como não o são quartos de hotel, vagas de garagem, bois e avestruzes, para ficar apenas em alguns dos exemplos mais famosos no Brasil. Do mesmo modo, o local onde o empreendimento será desenvolvido tende a ser irrelevante para o exame. As oportunidades de investimento ofertadas em Howey continuariam a ser valores mobiliários caso os laranjais não estivessem na Flórida, mas em São Paulo, assim como a busca da poupança brasileira para um investimento coletivo na engorda de boi pode configurar um contrato de investimento coletivo independentemente do local em que o gado irá pastar. Em resumo: pode haver  contrato de investimento coletivo mesmo quando a totalidade dos recursos captados é aplicada em outro país na criação, desenvolvimento ou aquisição de ativos ou atividades que não estão sujeitos à disciplina da CVM. Afinal de contas, o conceito tem natureza instrumental e o regime mobiliário não busca proteger laranjas, quartos hotéis, bois ou criptoativos, mas a poupança brasileira.” Processo Administrativo Sancionador CVM n.º 19957.007994/2018-51. Julgado em 09 de junho de 2020. Relator: Diretor Gustavo Machado Gonzalez.

[21]O conceito aberto de valor mobiliário previsto no inciso IX do artigo 2º da Lei 6.385/76 tem inspiração em precedente da Suprema Corte dos Estados Unidos, do qual se extrai as premissas do ‘Teste de Howey’, que vem sendo utilizado pela CVM para avaliar se determinado ativo é valor mobiliário.” Parecer de Orientação CVM n.º 40, de 11 de outubro de 2022. Disponível em: < https://conteudo.cvm.gov.br/legislacao/pareceresorientacao/pare040.html >. Acessado em: 05 de junho de 2024.

[22] Criptoativo alternativo, diferente do bitcoin, o que inclui o Ether.

[23] “This is why virtually all altcoins have a team in charge; they began the project, marketed it, designed the marketing material, and plugged press releases into the press as if they were news items, while also having the advantage of mining a large number of coins early before anybody had heard of the coins. These teams are publicly known individuals, and no matter how hard they might try, they cannot demonstrate credibly that they have no control over the direction of the currency, which undermines any claims other currencies might have to being a form of digital cash that cannot be edited or controlled by any third party. In other words, after the bitcoin genie got out of the bottle, anybody trying to build an alternative to bitcoin will only succeed by investing heavily in the coin, making them effectively in control of it. And as long as there is a party with sovereign power over a digital currency, then that currency cannot be understood as a form of digital cash, but rather, a form of intermediated payment-and a very inefficient one at that.” AMMOUS, Saifedean. The Bitcoin Standard: The Decentralized Alternative to Central Banking. Hoboken: Wiley, 2018.

[24] “MicroStrategy executive chair Michael Saylor speculated that the United States Securities and Exchange Commission will deny listing and trading of spot Ether exchange-traded funds. Speaking at MicroStrategy’s Bitcoin For Corporations conference on May 1, Saylor said the SEC would label ETH as a crypto asset security under its regulatory purview and not a commodity under the U.S. Commodity Futures Trading Commission.” SEC will classify Ether as security deny sport Ether ETFs – Michael Saylor, por Turner Wright, Cointelegraph, 3 de maio de 2024. Disponível em: < https://cointelegraph.com/news/michaelsaylorsecethersecurity >. Acesso em 28 de maio de 2024.

[25] COLLINS, Jeff Wilser. 3 Questions About the SEC’s Abrupt ETH ETF Approval. CoinDesk, 24 maio 2024. Disponível em: < https://www.coindesk.com/opinion/2024/05/24/3questionsaboutthesecsabrupt ethetfapproval/ >. Acesso em: 5 de junho de 2024.

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