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CVM disponibiliza parecer orientativo sobre criptoativos e o mercado de valores mobiliários

 

 

Recentemente, a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) publicou o Parecer de Orientação nº 40/22 que dispõe sobre os criptoativos e o mercado de valores mobiliários. De longe, o Parecer não esgota todas as dúvidas e anseios dos empreendedores do mundo cripto – até mesmo porque essa não era o objetivo – mas é certo que representa um importante passo na construção da regulação cripto no Brasil, um país cripto friendly. 

O documento consolida uma série de entendimentos da CVM, já emitidos em processos administrativos e outros pareceres. Estabelece os limites de atuação da Autarquia, a forma que ela irá normatizar, fiscalizar e disciplinar a atuação dos agentes do mercado. Além disso, reitera que é receptiva às novas tecnologias que vierem a contribuir e influenciarem positivamente na evolução do mercado mobiliário, como uma forma de ampliação de horizontes. 

De início, destaca que o objetivo do parecer é garantir maior previsibilidade e segurança, bem como fomentar um ambiente favorável ao desenvolvimento do mercado. O proposito, dessa forma, é a proteção ao investidor e da poupança popular; prevenção e combate à lavagem de dinheiro; prevenção e combate à corrupção; controle de evasão fiscal; prevenção e combate ao financiamento do terrorismo e/ou proliferação de armas de distribuição em massa. 

Destaca que o fato de um serviço ou ativo ser desenvolvido ou ofertado digitalmente, por meio criptográfico ou em tecnologia de registro distribuído, não implica diretamente no seu enquadramento enquanto valor mobiliário, mas sim que tal caracterização dependerá da sua natureza e características, a serem analisadas caso a caso. 

De acordo com o Parecer, a Autarquia indica que a caracterização de um criptoativo enquanto valor imobiliário ocorre quando representar ou enquadrar-se no rol taxativo previsto nos incisos I a VIII do artigo 2º da Lei 6.385 e/ou na Lei 14.430 (certificado de recebíveis em geral) ou, ainda, quando se enquadra no conceito de contrato de investimento coletivo. Ainda, vale o adendo de que o referido artigo 2º, de forma  

geral, possui rol exemplificativo, confoRme estabelece seu inciso IX.1 

No tocante ao rol taxativo, não há o que ser dito, em razão da previsão expressa. O mesmo não se aplica aos ativos previstos na Lei 14.430 de 2022. 

A leitura que se faz, da análise conjunta do Parecer nº 40 da CVM e dos artigos 18 e 20, §1º, da Lei 14.430, a emissão desses recebíveis, que só pode ser feita por empresas específicas, quando tokenizados e ofertados publicamente, tornam-se valores mobiliários. 

Em relação a esse último, a CVM indica que, deliberadamente, está se valendo das premissas do Howey Test para definir se tratasse de um valor mobiliário ou não, sendo   

1 Art. 2º, IX – ‘’quando ofertados publicamente, quaisquer outros títulos ou contratos de investimento  coletivo, que gerem direito de participação, de parceria ou de remuneração, inclusive resultante de prestação  de serviços, cujos rendimentos advêm do esforço do empreendedor ou de terceiros.’’

que reiteradamente tem considerado as características de:

 

  1. a) investimento;  
  2. b) formalização;  
  3. c) caráter coletivo do investimento;  
  4. d) expectativa de benefício econômico; 
  5. e) esforço de empreendedor ou terceiro; e 
  6. f) oferta pública para tal definição. 

 

Vale destacar, ainda, que antes desse documento muitos empreendedores não sabiam como emitir um security token, todavia as informações agora veiculadas no parecer fornece um roadmap de como se realizar a sua emissão. 

Além disso, em atenção ao princípio da ampla e adequada divulgação das informações (full and fair disclosure), o Parecer traz um conjunto exemplificativo mínimo de informações de informações que devem ser fornecidas ao público e mercado em geral. Sintetizadas em duas grandes premissas, as informações deverão dizer respeito sobre os Direitos dos Titulares dos Tokens e sobre as Negociações, Infraestrutura e Propriedade dos Tokens. 

Sumarizados, no tocante aos direitos dos titulares, deverá constar a identificação do emissor; descrição dos direitos dostitulares; mecanismos de consenso e emissão; canais de suporte ao investidor; descrição das atividades do emissor; informações sobre expectativas de benefício econômico; materiais sobre riscos ligados à tecnologia e taxas e encargos. 

Quanto às informações sobre Negociações, Infraestrutura e Propriedade dos Tokens deverão constar as informações sobre vantagens de utilização da tecnologia; descrição da gestão e propriedade dos tokens; regras de governança e protocolo; controle de origem e recurso; vantagens de registro distribuído; identificação dos titulares e tratamento de dados; entidades administradoras de mercado organizado e planejamento das funcionalidades. 

Nesta linha, a Autarquia alerta que os intermediários em mercado secundário que atuem, direta ou indiretamente, na oferta de criptoativos deverão observar as regulações da CVM, no que diz respeito à negociação de valores mobiliários, bem como observar o princípio da transparência acima trabalhado. Ainda no que concerne ao mercado secundário, é preciso registrar que a comercialização de qualquer security token somente pode ocorrer em mercados organizados que possuam autorização da CVM. 

Atualmente, o único mercado autorizado para negociação de Valor Mobiliário é a B3. Porém não há, atualmente, suporte tecnológico para viabilizar transações desse tipo de ativo, o que torna preocupante a sua emissão. No tocante aos fundos de investimento, a CVM manteve a impossibilidade desses investirem diretamente em criptoativos, quebrando a expectativa do ecossistema, mas alertando que o assunto será enfrentado novamente com a evolução da temática. 

Outro ponto interessante do documento é o alerta da CVM quanto à oferta de valores mobiliários emitidos no exterior poder ser considerada irregular, caso destine-se a atingir um público em geral residente no Brasil, ainda que essa oferta esteja em idioma estrangeiro e seja mediante login e senha.

Por fim, destaca a existência do regime de SandBox Regulatório, com 4 projetos criptos já rodando, sendo que três deles envolvem diretamente a atividade de tokenização de valores mobiliários. 

Conforme dito, as orientações constantes no Parecer estão longe de esgotar a temática ou trazer segurança jurídica para os empreendedores, mas com certeza está diante de um grande passo dessa longa caminhada regulatória do mercado cripto no Brasil. 

 

 

 

Mariana Oliveira é advogada e entusiasta do mundo cripto. Contribui para a segurança jurídica dos negócios criptos através da elaboração de contratos. Possui expertise em privacidade e proteção de dados pessoais.

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