1. Introdução
Os elementos do mundo que nos cercam podem ser analisados sob diversos prismas, que funcionam como lentes de óculos. Tais lentes podem ser de várias cores, que seriam marcos teóricos ou filosofias que guiam a nossa visão.
Neste artigo, far-se-á uma análise à ciência jurídica cripto sob dois marcos teóricos, quais sejam:
1) As classificações tricotômicas dos signos, segundo os estudos de Charles Peirce; e 2) o princípio da imputação objetiva, de Hans Kelsen.
2. Marcos teóricos
O ser humano interpreta o mundo ao seu redor por meio de raciocínios lógicos e aprendizados de signos que são encaixados em certas categorias, com o uso frequente de silogismos Por exemplo: Se o céu está escuro, é porque irá chover. Se a pessoa tem uma Ferrari, deve ser rica. Se o time de futebol tiver certo escudo, jogará bem a partida.
A semiótica é como se denomina os estudos dos signos, sua composição e importância na sociedade, a qual tem Charles Peirce como grande estudioso do tema. Daí a importância do marco teórico da semiótica para o presente artigo. A sua etimologia advém das palavras gregas semeios (signo) e logos (razão ou estudo)[1].
Além de interpretar o mundo ao seu redor por meio de signos, o ser humano deseja organizar a sociedade de maneira coercitiva por meio do direito. E o faz justamente por intermédio da interpretação de signos. Por isso a importância da conjugação da semiótica com o olhar jurídico.
Esmiuçemos, primeiro, a ciência da semiótica.
2.1. Semiótica de Charles Pierce
Devemos nos valer dos estudos de Charles Peirce, renomado filósofo e lógico americano responsável por um aprofundamento técnico na seara semiótica.
Peirce tem predileção por tricotomias e as utiliza para dissertar sobre os signos. Um signo, também chamado de representamen, é tudo aquilo que, sob certo aspecto ou modo, representa algo para alguém [2].
Mas o que seria representar? Para o estudioso, seria estar em lugar de, isto é, estar numa tal relação com um outro que, para certos propósitos, é considerado por alguma mente como se fosse esse outro [3].
Assim, um deputado, advogado, sintoma, conceito, premissa, testemunho, todos, a seu modo, representam alguma coisa para mentes que o interpretam sob esse aspecto. Àquilo que representa algo dá-se o nome de representamen.
O representamen ou signo está envolvo em uma relação triádica com o interpretante e o objeto. Assim, há 3 elementos lógicos que compõem os estudos dos signos: 1) o próprio signo, também chamado de representamen; 2) o interpretante; e 3) o objeto. Vejamos o que seria o interpretante e o objeto.
À ideia gerada na mente de quem faz contato com um representamen é o que se chama de interpretante. Por exemplo, ao ver um muro com um buraco aparentemente causado por disparo de arma de fogo, é gerada a ideia de que houve um tiroteio naquele lugar. Essa ideia é o interpretante, uma reação sobre o cérebro4.
Por fim, o objeto é aquilo que é representado pelo signo. O objeto pode ser uma coisa singular existente e conhecida ou que se acredita tenha anteriormente existido ou que se espera venha a existir, ou um conjunto de tais coisas, ou uma qualidade, relação ou fato conhecidos [5]. Isto é, basicamente qualquer coisa cognoscível pode ser um objeto de um signo. Tudo aquilo que pode ser representado.
Pode parecer complicado, mas não é. Vejamos a figura abaixo [6]
No caso da figura, há a fumaça, o fogo e a imagem que se forma na mente de quem vê a fumaça.
A fumaça é o signo ou representamen, o efeito que se forma na mente de quem avista a fumaça – de que há algo pegando fogo – é o interpretante e, o fogo, por fim, é o objeto. Pensemos no bitcoin, por exemplo. Qual o seu signo ou representamen, interpretante e objeto?
Não há respostas certas ou erradas. Podemos classificá-lo da seguinte forma:
1) signo ou representamen: A própria palavra bitcoin ou seu símbolo.
2) interpretante: Uma medida de valor virtual e escassa.
3) objeto: registro criptográfico realizado de maneira descentralizada via blockchain.
E não é só. A predileção tricotômica do Peirce não acaba por aqui. Ele classifica os signos ou representamens em 3 categorias [7], a depender da substância dos 3 elementos já vistos – representamen, interpretante e objeto. Surge, então, a classificação de signos denominados como 1) Ícone; 2) Índice; ou 3) Símbolo.
O signo ícone é aquele em que o representamen possui as mesmas características próprias do objeto representado. A única maneira de se comunicar diretamente a uma ideia é justamente através desse tipo de signo. Exemplos de tais ícones são as fotografias, pois são exatamente como os objetos que representam [8].
A classificação de signo índice se refere ao representamen que possui alguma qualidade em comum com o objeto e a ele se refere de forma menos direta que o ícone e, portanto, exige maior esforço mental para se chegar ao objeto. Tem-se como exemplo o cata-vento. O fato de ele girar é um signo que nos traz uma informação à mente que passa por uma fase que antecede à conclusão lógica. O interpretante – ideia que se forma na nossa mente – deve associar o movimento à conclusão lógica da existência de vento em certo sentido. O mesmo ocorre com buracos de tiros em uma parede. Imaginamos que houve um tiroteio naquele local, mas tal conclusão não é direta tal qual o é no signo ícone.
O signo símbolo, por sua vez, é o representamen que se refere ao objeto em virtude da existência de uma lei, convenção social ou associação de ideias gerais. Ele em si é geral, assim como o seu objeto, pois é preciso que todos o conheçam. Todas as palavras, frases, livros e outros signos convencionais são símbolos[9]. Uma palavra falada é apenas um conjunto de sons que nada tem a ver com o seu objeto que não seja a sua convencionalidade – com exceção das onomatopeias. Não por acaso entendemos os significados apenas das palavras das línguas que conhecemos.
Pensemos novamente no bitcoin. Como podemos observá-lo a partir dessa classificação de signos em ícones, índices e símbolos?
1) ícone: A hash das transações, os endereços das carteiras e seus respectivos saldos.
2) índice: Pode-se analisar as previsões de preços via análise gráfica e geopolítica, que nada mais são que índices.
3) símbolo: O valor a ele atribuído por uma convenção social de oferta e demanda.
2.2. Princípio da Imputação Objetiva de Hans Kelsen
Passemos, agora, a esmiuçar o raciocínio jurídico. Até o momento não entrelaçamos a análise semiótica com base nos estudos de Peirce à ciência jurídica.
De antemão, relevante ressaltar a escolha da terminologia ciência jurídica invés de direito. Afinal, por que o título do presente artigo não adotou a terminologia “direito”? Poder-se-ia ter o título como “Uma análise entrelaçada da semiótica ao direito cripto”.
Tal escolha se deve ao fato do nosso marco teórico da Teoria Pura do Direito, de Hans Kelsen, separar o direito da ciência jurídica. Enquanto o direito prescreve, permite, confere poder ou competência, a ciência jurídica descreve e conhece o direito “de fora” [10]. Ou seja, não é objetivo do presente artigo a análise das normas do direito, mas tão somente demonstrar a importante contribuição da semiótica para a ciência jurídica voltada ao mundo cripto.
Pois bem. Sabe-se que ao menos grande parte dos leitores do presente artigo advêm da seara jurídica, porém não custa revisitarmos o raciocínio de Kelsen que será relido no presente artigo sob a lente de semiótica à ciência jurídica cripto.
Tal raciocínio está presente no princípio da imputação objetiva. Sob o olhar das leis na natureza, Kelsen percebe que vigora o princípio da causalidade, o qual nada mais é que a ordem infinita de consequências da natureza, de causa e efeito, tal como a dilatação de um metal ao ser aquecido. A dilatação ocorre de forma natural por meio do princípio da causalidade. Nesse caso, pode-se dizer que quando A é, B é.
No âmbito da proposição jurídica, Kelsen disserta que vigora o princípio ordenador da imputação objetiva, o qual se assemelha ao da causalidade, porém com a diferença de que não incide de forma natural. Por isso que na proposição jurídica não se diz, como na lei natural, que, quando A é, B é, mas que, quando A é, B deve ser, mesmo quando B, porventura, efetivamente não seja [11].
Tal princípio é imperioso. O dever ser nada mais é que a afirmação de que a proposição jurídica prescreve uma consequência para uma situação prevista em lei, porém sabe-se que nem a todo crime há a aplicação de uma pena, como ocorreria com o princípio da causalidade, o qual não dá margem a erro, pois a dilatação do metal não passa pela investigação e burocracia estatal.
Entender a imputação objetiva é o que nos basta para o entrelaçamento da semiótica à ciência jurídica cripto para o presente artigo.
3. Análise entrelaçada da semiótica à ciência jurídica cripto
Passemos, dessarte, ao entrelaçamento em si dos marcos teóricos e à demonstração da importância de tal leitura à ciência jurídica cripto.
Ao coligarmos os estudos semióticos de Charles Peirce ao princípio da imputação objetiva de Hans Kelsen, pode-se observar que a aplicação do direito é um ato semiótico per si, pois o amoldamento de uma situação fática à proposição jurídica, ao contrário do que ocorre na natureza – princípio da causalidade – depende da análise se os signos do mundo do ser se encaixam nos signos do mundo do dever ser.
Tome-se como exemplo a seguinte análise de amoldamento de signos à proposição jurídica: se o art. 121 do Código Penal Brasileiro traz os signos a) matar e 2) alguém, deve-se observar no mundo do ser se de fato houve morte de alguém. E isso é feito por meio de signos. O próprio conceito de morte é um signo símbolo – criado por uma regra – cunhado pelo Conselho Federal de Medicina pela Resolução CFM nº 2.173/17, que o define como a cessação da atividade encefálica. Sem a observância do signo símbolo da morte, não há de se falar no crime tipificado no artigo supracitado, pois o signo do ser não se amolda ao do dever ser.
O professor José Rodrigo Rodriguez trata com leveza a interpretação do mundo sob o olhar jurídico ao exemplificar a plurissignificação do queijo parmesão para um chef de cozinha, produtor, comerciante e para fins tributários, cada qual com a definição que lhe interessa [12].
É claro que o chef de cozinha terá um enfoque nas notas degustativas do alimento, ao passo que o Fisco levará em conta o amoldamento do objeto às normas tributárias – princípio da imputação objetiva – para saber se se trata de um queijo parmesão ou outro tipo de laticínio, pois o Estado apenas pode atuar na legalidade estrita e tributar somente aquilo que foi previamente previsto em lei.
Assim, percebe-se que o princípio da imputação objetiva de Kelsen nada mais é que a análise se os signos do mundo do ser se amoldam às proposições jurídicas do mundo do dever ser. Este é o entrelaçamento relevante a este artigo.
E quando levamos tal conclusão à ciência jurídica cripto, vemos a importância de enxerga-la conjugada à semiótica, sobretudo em tempos da cruzada da Securities and Exchange Commission (SEC), que regula o mercado de capitais norte-americano, contra empresas do mundo cripto [13], o que pode ou não desencadear efeitos regulatórios semelhantes em outros países.
Mas afinal, o que é um criptoativo?
Criptoativo é o designativo de um gênero. Abarca todos os tokens em sentido amplo que permeiam a rede blockchain. Essa é a definição que guia o presente artigo [14].
Indo além, é possível classificar os tokens em sentido estrito, levando-se em conta para isso a sua função ou propósito, como os tokens infungíveis, das finanças descentralizadas, metaverso e jogos. Ou seja, são subespécies de do gênero criptoativos.
Em outras palavras, um criptoativo nada mais é que o veículo por meio do qual algo é representado na rede blockchain.
Destarte, o ato de representar algo é a pedra de toque dos criptoativos, fato esse que interage com muita harmonia à semiótica. Uma criptomoeda representa um valor de troca. Um NFT representa uma arte ou qualquer outra coisa. Um utility token representa alguma utilidade que se possa ter com a posse do criptoativo, como o acesso a eventos, por exemplo.
Assim, aquilo que o criptoativo ou token representa é o que importa à ciência jurídica, pois o princípio da imputação leva em conta a essência do ativo e, a depender dela, haverá um amoldamento jurídico diferente com consequências diferentes.
Inclusive, cabe dizer que a palavra “representação”, ou suas ramificações, é citada 11 vezes no Parecer de Orientação CVM nº 40, de 11 de outubro de 2022, o qual trata dos CriptoAtivos e o Mercado de Valores Mobiliários [15], o qual afirmou que os criptoativos (ou a sua propriedade) são representados por tokens, que são títulos digitais intangíveis. Repare-se na escolha
deliberada da palavra “representar”.
A palavra “representação”, não por acaso, também está presente diversas vezes na Instrução Normativa nº 1888 da Receita Federal do Brasil, na recente lei nº 14478/2022, no Ofício-Circular nº 4/2023/CVM/SSE e no recentíssimo Projeto de Lei nº 4171/2023 aprovado pelo Congresso, o qual tributa criptoativos em corretoras do exterior ou em carteiras digitais.
Vale notar, ainda, que tanto os EUA, desde 1946, quanto o Brasil, desde 1976, adotam o Howey test como metodologia para analisar se determinado objeto de análise é ou não um valor mobiliário, senão vejamos as perguntas de tal teste em inglês, em que há a caracterização de valor mobiliário quando as 4 seguintes perguntas são preenchidas [16]: 1) An investment of
Money; 2) In a common enterprise; 3) With the expectation of profit; 4) To be derived from the efforts of others.
No Brasil, a CVM realiza as mesmas perguntas por formas diferentes, isto é, por signos diferentes, quais sejam [17]: 1) Investimento: aporte em dinheiro ou bem suscetível de avaliação econômica; 2) Formalização: título ou contrato que resulta da relação entre investidor e ofertante, independentemente de sua natureza jurídica ou forma específica; 3) Caráter coletivo do investimento; 4) Expectativa de benefício econômico: seja por direito a alguma forma de participação, parceria ou remuneração, decorrente do sucesso da atividade referida no item (v) a seguir; 5) Esforço de empreendedor ou de terceiro: benefício econômico resulta da atuação preponderante de terceiro que não o investidor; e 6) Oferta pública: esforço de captação de recursos junto à poupança popular.
Curioso notar que o mero fato de tal teste ser um transplante jurídico internacional já faz com que possam haver divergências interpretativas sobre a sua essência, isto é, que a autarquia brasileira interprete os signos de tal teste – sobretudo as palavras, que são signos símbolos – de forma diferente ao órgão dos Estados Unidos da América.
Não por acaso o Parecer 40 da CVM, em sua página 7 [18], estatui que apesar de a SEC utilizar o mesmo método, prevalece o entendimento pátrio, o que confirma o fato de que os signos de que um ativo seja valor mobiliário podem ser interpretados de forma diferentes, ainda que a sua origem conceitual seja a mesma.
Está cristalino que sendo o criptoativo ou token um veículo semiótico de representação de algo na rede blockchain, nos interessa averiguar aquilo que está sendo representado, isto é, o objeto do signo.
No entanto, nem sempre o objeto deste veículo é de fácil constatação. O token pode ser um signo ou representamen classificado como ícone, índice ou símbolo.
Não há respostas corretas sobre a classificação de criptoativos e essa seria a beleza da semiótica, ciência essa que apesar de parecer exata, também tem subjetividades. Por exemplo, seria o bitcoin um criptoativo que tem como objeto ser uma moeda – inclusive por ser moeda de curso legal em alguns países? Ou seria um ativo financeiro, como ações da bolsa de valores? E por que não ser classificado como um ouro digital? Seria um valor mobiliário, conforme tecemos algumas considerações acima?
O mesmo serve para tokens que dão acesso a eventos, itens exclusivos, networking, participação nos lucros, direitos de voto, propriedades em bens móveis e imóveis, acesso a tecnologias na web3. Ora, o que são tais tokens? Para cada resposta há um amoldamento e consequência diferente – conforme a análise semiótica e o princípio da imputação objetiva.
Quanto à classificação dos tokens conforme a sua essência, pode-se dizer que o Bitcoin seria um signo ícone, pois representa o valor digital e se confunde com ele. O Ether seria um signo índice, pois ele possibilita a criação de soluções cripto. E um utility token seria um signo símbolo, pois o fato de se ter alguma utilidade por meio do token seria uma convenção entre uma marca famosa e os possuidores do token.
Lembro o leitor de que não há respostas certas. Será que o Bitcoin seria um signo símbolo pelo fato de todos acordarem o seu preço via livre mercado, o Ether seria um signo ícone por se confundir com a sua aplicabilidade de desenvolver soluções e um utility token seria também um signo ícone por representar exatamente a utilidade ofertada? Ou seriam todos signos índices?
Pois bem, já ficou claro que não há resposta mais correta e tudo depende do enfoque que é dado à análise do signo cripto.
4. Conclusão
Feito tal raciocínio até esta etapa do artigo, temos algumas conclusões lógicas importantes. São elas:
1) Um signo é aquilo que contém um representamen, interpretante e objeto. O representamen é o modo pelo qual o signo se exterioriza, o interpretante é a imagem formada na mente de quem tem contato com o representamen e o objeto é o que de fato é representado pelo signo;
2) Ainda, um signo ícone é aquele que possui as mesmas características próprias do objeto representado. Um signo índice possui alguma qualidade em comum com o objeto e a ele se refere de forma menos direta que o ícone e, portanto, exige maior esforço mental para se chegar ao objeto. E um signo símbolo se refere ao objeto em virtude da existência de uma lei, convenção social ou associação de ideias gerais;
3) O princípio da imputação objetiva se assemelha ao da causalidade, porém com a diferença de que não incide de forma natural. Por isso que na proposição jurídica não se diz, como na lei natural, que, quando A é, B é, mas que, quando A é, B deve ser, mesmo quando B, porventura, efetivamente não seja [19];
4) O princípio da imputação objetiva nada mais é que a análise se os signos do mundo do ser se amoldam às proposições jurídicas do mundo do dever ser.
5) A lei, fonte primária do direito, é positivada em palavras de uma certa língua, o que faz com que seja exteriorizada por meio de signos classificados como símbolos, vez que as palavras são convenções sociais acerca de seus significados.
6) Um criptoativo nada mais é que o veículo por meio do qual algo é representado na rede blockchain – o que demonstra a intrínseca relação entre criptoativos e semiótica, visto que se trata de representações.
7) As hashs de transações, os códigos dos smart contracts e, em resumo, tudo que é relativo à linguagem de computador ou registros alfanuméricos são signos ícones. O nome do token é um ícone símbolo. As análises de preço são signos ícones.
8) O objeto do signo – ou representamen – do criptoativo ou token é a pedra de toque em relação à imputação objetiva. Quando o dever ser encontra a essência do cripto, o seu objeto, há um amoldamento legal do mundo do dever ser ao do ser.
9) Identificar o objeto do criptoativo não é tarefa fácil, pois há tokens que são signos ícones, índices ou símbolos. Nem sempre a função do token está clara.
Assim, após todas as considerações, chega-se ao final do presente artigo. O intuito deste estudo foi apresentar a análise semiótica dos criptoativos entrelaçada à ciência jurídica. Não foi o de fornecer respostas certas sobre a essência ou amoldamento legal de diversas criptos, mas tão somente fornecer ferramentas analíticas que as mentes pensantes deste ambiente possam utilizar na construção de seus projetos e teses jurídicas.
Cabe dizer, ainda, que sempre é bem-vinda a diminuição das margens interpretativas por meio de uma legislação mais precisa (signo símbolo). É impossível eliminar tais margens, pois o direito não é uma ciência exata, contudo deve-se ter mais segurança jurídica, o que não é fato excludente para a análise do presente artigo, a qual sempre se fará necessária.
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Thiago Freire é formado em direito pela Universidade Presbiteriana Mackenzie. Atuou no Ministério Público Federal da 3º Região como estagiário. Advogado na Alexandre Arregui International Legal Services and Advisory, escritório em que atua com Planejamento e Proteção Patrimonial Internacional.
NOTAS:
[1] https://origemdapalavra.com.br/palavras/semiotica/.
[2] Peirce, Charles Sanders. Semiótica. Tradução de José Teixeira Coelho Neto. São Paulo: Perspectiva, 2005, p. 46.
[3] Idem, ibidem, p. 61.
[4] Idem, ibidem, p. 64.
[5] Idem, ibidem, p. 48.
[6] Figura retirada de https://periodicos.fclar.unesp.br/casa/article/view/552/472.
[7] Idem, ibidem, p. 52.
[8] Idem, ibidem, p. 65.
[9] Idem, ibidem, p. 71.
[10] Kelsen, Hans. Teoria pura do direito. Tradução João Baptista Machado. 6ª ed. – São Paulo: Martins Fontes, 1998, p. 51.
[11] Idem Ibidem, p. 55.
[12] Rodriguez, José Rodrigo. Os Conceitos Jurídicos. Publicado em “Organização das Relações Privadas” – ed. Quartier Latin, p. 4. “O comerciante, o gourmet e o fabricante olham o queijo a partir de outros pontos de vista. Se chamados a defini-lo, certamente ressaltariam outros de seus aspectos, importantes para os seus respectivos fins. A definição legal de parmesão não está diretamente a serviço destes fins. O direito tem seus objetivos específicos, por isso mesmo, precisa de uma definição própria de queijo parmesão.”
[13]Costa, Isac. SEC x Cripto: Vigiar e Punir ou Compreender para Regular. Artigo publicado em CriptoJur: https://criptojur.com/news/sec-x-cripto-vigiar-e-punir-ou-compreender-pararegular/
[14]Definição dada pelo Prof. Alexandre Senra no curso “Smart Contracts para Advogados” ministrado em 26.04.2023
[15] Tome-se como exemplo: “Criptoativos são ativos representados digitalmente, protegidos por criptografia, que podem ser objeto de transações executadas e armazenadas por meio de tecnologias de registro distribuído (Distributed Ledger Technologies – DLTs)1. Usualmente, os criptoativos (ou a sua propriedade) são representados por tokens, que são títulos digitais intangíveis.” – primeiro parágrafo do Parecer de Orientação CVM nº 40, de 11 de outubro de 2022.
[16] Mendelson, Michael. “From Initial Coin Offerings to Security Tokens: A U.S. Federal Securities Law Analysis. https://law.stanford.edu/wpcontent/uploads/2019/01/Mendelson_20180129.pdf. Stanford Technology Law Review, vol. 22, no. 1, Winter 2019, pp. 66.
[17] Página 7 do Parecer de Orientação CVM nº 40, de 11 de outubro de 2022.
[18] Ciente, portanto, de que a definição legal brasileira de contrato de investimento coletivo tem inspiração no direito americano, a CVM acompanha com atenção a interpretação naquela jurisdição dos casos em que criptoativos são enquadrados como valor mobiliário. Não obstante, ressalva-se que o entendimento pátrio pode ser distinto do estrangeiro em casos concretos, uma vez que a origem e a inspiração não determinam identidade conceitual, tampouco interpretativa – página 7 do Parecer de Orientação CVM nº 40, de 11 de outubro de 2022.
[19] Idem Ibidem, p. 55.
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