*Antídio Souza
O movimento de alta do mercado de criptoativos nas últimas semanas traz à tona a grande pergunta: é o fim do Bear Market? Será que o touro finalmente colocou o urso para hibernar e estamos diante do início de um duradouro ciclo de alta?
Depois de um 2022 extremamente desafiador, marcada pelos colapsos da Terra Luna, da FTX e outros eventos que abalaram a confiança no mercado cripto, e de um 2023 caracterizado pela cautela em relação ao cenário regulatório, com destaque para a inquisição da SEC (Securities and Exchange Comission) contra os negócios cripto, a alta do mercado ascende a esperança dos investidores pela chegada de dias melhores.
Independentemente de indicadores ou tendências gráficas, fato é que um dos principais vetores dessa reação é a expectativa a respeito da aprovação dos ETFs spot (mercado à vista) nos Estados Unidos.
Mas afinal, o que são ETFs?
Os ETFs (Exchange Traded Funds), ou também chamados Fundos de Índice, são produtos financeiros que funcionam como uma ‘’cesta’’ de ativos, e têm como referência um determinado índice (Ex: Ibovespa, S&P 500). Se diferenciam dos fundos de investimento principalmente pelo benchmark e pelo tipo de gestão. Enquanto muitos fundos de investimento possuem gestão ativa e têm como foco superar um índice de referência, os ETFs objetivam espelhá-lo.
No Brasil há vários ETFs de criptoativos, com destaque para o HASH11, que acompanha o Nasdaq Crypto Index (NCI) e é o maior do país em volume de negociação. Sua composição é atualmente formada por 08 ativos: Bitcoin (BTC), Ethereum (ETH), Chainlink (LINK), Litecoin (LTC), Polkadot (DOT), Stellar (XLM), Uniswap (UNI) e Ethereum Classic (ETC), sendo que mais de 90% de seu peso deriva de Bitcoin e Ethereum.
O cenário de aprovação dos ETFs Cripto nos Estados Unidos
Atualmente há mais de dez pedidos de registro de ETFs cripto que aguardam um aval da SEC para começarem a ser ofertados no mercado. Dentre eles, se destacam o pedido de registro de um ETF de Bitcoin por parte da gigante BlackRock, e o pedido de conversão do ETF GBTC para um ETF de Bitcoin à vista, realizado pela gestora GrayScale.
Vale lembrar que em agosto desse ano a GrayScale conseguiu uma vitória importante no Tribunal de Apelações do Distrito de Columbia ao reverter uma negativa da SEC em relação a esse pedido de conversão. O fato aumentou ainda mais a confiança do mercado sobre a aprovação das outras solicitações de registro. Dois fatores a respeito da supramencionada decisão proferida pelo Tribunal merecem destaque especial:
1) Desde a derrocada da corretora FTX, a SEC ‘’engrossou o caldo’’ contra o mercado de criptoativos. A partir do discurso de proteção dos investidores, Gary Gensler e seus comandados têm tratado as empresas e produtos do mercado cripto como males a serem combatidos, no melhor estilo ‘’caça às bruxas’’. Contudo, é notório o cometimento de excessos nessa abordagem, pois há muitos negócios que desempenham um trabalho sério, oferecem produtos de qualidade e são favoráveis à regulação, em prol da segurança dos investidores. E isso está ficando cada vez mais visível para os Tribunais, que têm imposto algumas perdas à SEC em casos recentes.
2) Como nos Estados Unidos a estrutura jurídica é pautada no sistema do common law, os juízes tendem a acompanhar entendimentos formados por decisões anteriores dos Tribunais. Assim, precedentes a favor de empresas cripto que estão oferecendo produtos em conformidade com as normas tendem a se consolidar, o que pode acarretar derrotas sucessivas à SEC caso a postura atual seja mantida.
Qual é o impacto da aprovação dos ETFs Cripto nos EUA para o mercado?
Pelo lado dos atores do mercado, a aprovação dos ETFs cripto nos Estados Unidos, o maior mercado de investimentos do mundo, seria um marco extremamente importante para a validação e amadurecimento do mercado em todos os sentidos, principalmente o regulatório.
Além disso, uma regulamentação satisfatória e bem dosada atrairá grande volume de capital institucional. Afinal, estamos falando de um mercado de mais de 1 trilhão de dólares. A valorização dos criptoativos nos últimos dias a partir dos rumores de aprovação dos ETFs demonstra quão grande é a demanda e o interesse pelo mercado cripto.
Ao que parece, investidores e empresas estão posicionados como carros de corrida na linha de largada, apenas aguardando o sinal verde da regulação para pisarem fundo e alocarem grande quantidade de recursos no mercado.
Só para se ter ideia, de acordo com um relatório divulgado recentemente pela CNN, os investimentos em mineradoras de Bitcoin por parte da BlackRock, a maior gestora de ativos do mundo, ultrapassam os 400 milhões de dólares.
Por parte dos investidores pessoas físicas, a aprovação dos pedidos de registro dos ETFs representa um aumento significativo de credibilidade e segurança em relação aos criptoativos, que ainda sofrem com a desconfiança e o ceticismo de muitos.
Já em relação ao contexto macroeconômico, essa aprovação pode resultar em uma melhora na visão do ecossistema cripto em relação aos Estados Unidos, que em razão da postura adotada pelos órgãos reguladores vinha se tornando um país a ser evitado, seja para criação de novos negócios, seja para a manutenção dos negócios ali constituídos. Não por acaso está havendo um movimento migratório considerável para jurisdições mais amigáveis, a exemplo de Dubai, Estônia, Singapura e Suíça.
A queda na criação de negócios e a migração dos negócios existentes para outros países traz sérias consequências para a economia americana: fuga de capital, retração da atividade econômica, aumento do desemprego, diminuição da arrecadação provenientes de tributos e, como resultado, queda do PIB (Produto Interno Bruto).
Se pensarmos no cenário político, aumentar os riscos de piora na economia não parece ser uma atitude inteligente, considerando que as eleições presidenciais ocorrerão em 2024.
Além de todos esses fatores, a acalorada discussão em torno da aprovação de ETFs de criptoativos nos Estados Unidos é reflexo do crescente interesse e adoção dos criptoativos. A tendência é que nos próximos anos estejamos em um mundo cada vez mais tokenizado, com soluções baseadas em blockchain e outras DLTs (Distributed Ledger Technologies) que vão muito além dos investimentos. No entanto, os desafios regulatórios seguirão existindo e precisamos nos manter atentos.
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*Antídio Souza é advogado especializado na estruturação e adequação jurídica de negócios que atuam no mercado de criptoativos, e em Direito Contratual. É certificado em Blockchain and Business pelo Blockchain Research Institute de Toronto/Canadá, membro da Crypto Valley Association de Zug/Suiça, e da Comissão de Blockchain e Ativos Virtuais das 36ª Subseção da OAB/SP. É também co-fundador do portal CriptoJur (criptojur.com). Instagram: @antidiosouza.
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