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O CROWDFUNDING COMO UMA ALTERNATIVA PARA OFERTA DE CRIPTOATIVOS

No mês de abril, a CVM editou o Ofício Circular de nº 4/23, ocasião em que tratou sobre a qualificação e emissão dos tokens de renda fixa.

A despeito de os presentes autores terem algumas ressalvas quanto ao posicionamento adotado pela CVM acerca das características de tais tokens, o presente texto irá se limitar a discorrer tão somente sobre a sua respectiva emissão, ou melhor, sobre a alternativa apresentada pela Comissão de Valores Mobiliários para que esses tokens sejam emitidos.

A autarquia, no referido ofício, destacou que as empresas que buscassem realizar a emissão de tokens de renda fixa ou quaisquer securities tokens, poderiam se valer das regras de Crowdfunding (Resolução CVM nº 88), hipótese em que a emissão deveria ser intermediada por plataformas de investimento participativo.

Antes de mais nada é preciso destacar que, atualmente, com exceção das ofertas via crowdfunding, a oferta pública de valores mobiliários, no Brasil, somente pode ser intermediada pela B3.

Registre-se, ademais, que a B3 ainda não implementou estrutura tecnológica suficiente para viabilizar a emissão de valores mobiliários em blockchain, o que faz as plataformas de investimento participativo serem a única alternativa para as empresas que desejam ofertar publicamente tais ativos.

Ainda que a B3 possuísse tecnologia suficiente para viabilizar essas emissões, as normas referentes a oferta pública de valores mobiliários (Resol. 160, da CVM), são inadequadas para a emissão de tokens, como, por exemplo, a exigência de agentes escriturário, custodiante e fiduciário, além de outras disposições constantes no corpo da norma.

Pois bem. Afirma-se que as plataformas de Crowdfunding são alternativas para a oferta pública desses produtos financeiros, pois existem plataformas de investimento participativo, já registradas na CVM, que detém a tecnologia necessária para viabilizar tais ofertas, algumas delas, inclusive, são tokenizadoras de ativos.
Ocorre que as ofertas via Crowdfunding impõem uma série de limitações que destoam da realidade dos criptoativos.
A seguir, destaco algumas delas.

Nos termos do art. 2º, I, da Resol nº 88, da CVM, apenas empresas de pequeno porte podem se valer das normas do Crowdfunding para realizar a emissão de valores mobiliários, estando dispensadas de adquirir o registro da oferta junto à CVM.

Entende-se por empresas de pequeno porte, aquelas que possuem renda bruta anual igual ou inferior à 40.000.000,00 (quarenta milhões de reais), ou 80.000.000,00, quando se tratar de grupo econômico. (art. 2º, VII, da Resol. CVM 88, c/c § 2º, do mesmo artigo).

É preciso destacar, no entanto, muitas empresas de médio porte também se valem, ou ao menos podem desejar se valer, da emissão de tais ativos, ocasião que, por não preencherem o requisito legal, estariam impossibilitadas de participar de tais emissões.

Destaca-se, ainda, que a norma traz limitações em relação ao montante captado, permitindo que a empresa emissora realize a captação de, tão somente, 15.000.000,00 no ano calendário, seja através de uma única oferta ou múltiplas ofertas dentro do período de 365 dias.
Inclusive, o prazo de duração de cada oferta não pode ser superior a 180 dias.

Salienta-se, que muitas empresas do ramo web 3 podem visar com tal emissão proceder a capitalização de recursos para o desenvolvimento do próprio projeto, o que torna a limitação indicada acima um desestimulo para a emissora.

Além da limitação do montante captado, a Resolução nº 88, da CVM, impede que a empresa emissora realize nova oferta, dentro do prazo de 120 dias contado da data de encerramento da oferta anterior que tenha logrado êxito. (art. 3º, 5º, da CVM).

Não é incomum verificar empresas que possuem como objeto social a realização de sucessivas emissões, a exemplo de securitizadoras, emissoras de ativos securitizados tokenizados.

Nesses casos, obstar a realização de uma nova oferta por um período tão extenso de tempo pode acabar por inviabilizar a persecução da própria atividade empresarial.
É preciso destacar, ainda, que o montante investido por cada investidor de varejo (retail investors) se encontra limitado a R$ 20.000,00, por ano calendário.

Partindo do pressuposto que a tokenização contribui para facilitar e baratear o processo de captação de recursos, essa limitação não encontra identidade nas ofertas de produtos financeiros tokenizados.

Para além das restrições indicadas acima, pontua-se que em plataformas de investimento participativo não existe a liquidez esperada de uma bolsa de valores, quiçá de um ambiente descentralizado.

Isso porque essa liquidez somente existe em ofertas realizadas por entidades autorizadas a atuar como administradoras de mercado organizado de valores mobiliários, nos termos da resolução nº 135, da CVM.A própria Resolução nº 88, da CVM, inclusive, deixa clara essa vedação, em seu artigo 15, § 1º.

Logo, em que pese ser permitido às plataformas de investimento participativo intermediar a negociação pontual dos valores mobiliários ofertados através delas, tal fato não deve ser interpretado como se houvesse a existência de um mercado secundário.

Além disso, somente podem participar de transações subsequentes os investidores ativos, ou seja, aqueles investidores cadastrados na plataforma e que, cumulativamente, estejam com o seu cadastro atualizado e tenham realizado investimento em ao menos uma oferta pública conduzida pela plataforma nos últimos 2 anos.

Note que existem, ainda, condições a serem preenchidas pelos investidores, o que acaba por reduzir ainda mais a circulabilidade dos títulos tokenizados.

Logo, é possível verificar que, nesse modelo de oferta, um dos maiores benefícios de realizar a tokenização de um ativo, qual seja, conferir liquidez a produtos ilíquidos ou de baixa liquidez, é tolhido.

Esses são apenas alguns pontos que demonstram a inadequação das normas de crowdfunding às ofertas de securities tokens.
Em que pese entendermos que existe claro conflito entre a resolução nº 88, da CVM e a oferta pública de security tokens, fato é que, atualmente, o Crowdfunding se mostra o único meio viável para legalizar a emissão pública de tais ativos.

Inclusive, os próprios representantes da Comissão de valores Mobiliários reconhecem essa inadequação, eis que afirmam que o uso de plataformas de investimento participativo é temporário, tendo em vista que, no curto prazo, é a maneira mais dinâmica e célere de fomentar as emissões de títulos financeiros tokenizados.

É preciso destacar, nesse ponto, a atuação benéfica da autarquia em promover o diálogo com os Players do mercado, de modo a evitar que a inexistência de normas específicas inviabilize o fomento da inovação no mercado financeiro brasileiro.

Nesse contexto, espera-se que a CVM, no curto prazo, dispense a aplicação de certos dispositivos da Resolução nº 88, quando se tratar de ofertas públicas de security tokens, sem perder de vista a necessidade de acelerar as discussões para a elaboração de um regramento próprio voltado para as ofertas de produtos financeiros tokenizados, de modo a estimular o aproveitamento de todos os benefícios decorrentes do processo de tokenização.
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Jorge Barros
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Othavio Andrade Furini
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